domingo, 13 de junho de 2010

Como começa o cinema documentário

O cinema documentário nasce quando? Nasce com Lumière, Flaherty, Vertov ou Grierson? Nasce com o “cinema de atrações” ou com o “cinema verdade”? Quando ele adquire uma identidade que o torna uma vertente do cinema? Hoje é unânime a opinião de que os documentários possuem uma voz (a voz é a maneira pela qual o filme se declara, se faz portador de uma opinião ou idéia do mundo), então, se essa voz de fato existe e é inerente ao documentário, a pergunta deveria ser orientada na sua direção: quando surge essa voz que caracteriza os documentários?

O documentário floresce quando adquire voz própria. Ele vai alcançar pleno reconhecimento somente no final da década de 1920 e início da década de 1930, com a combinação de elementos que o reconheciam como forma cinematográfica distinta, por exemplo, da ficção, são estas: exibição, documentação, experimentação poética, relato narrativo de histórias e oratória retórica.

O caráter de exibição está presente nos “filmes de atrações”, que priorizam o exibicionismo de fenômenos incomuns e aguça a curiosidade do público e dos cineastas por imagens do mundo. O caráter de documentação é gerado pela capacidade intrínseca da fotografia de produzir réplicas que têm uma relação íntima com o objeto representado (aspecto indexador). Essas características, embora façam parte da caminhada do documentário até adquirir sua própria voz, não são em si sinônimos dele, o primeiro por se direcionar ao espetáculo e o último para a ciência.

Outras características que desempenham papel importante no florescimento de uma voz dos documentários são a experimentação poética, o relato narrativo de histórias e a oratória retórica. O primeiro é importante pois traz uma consciência autoral do artista, coloca o cineasta na dianteira de sua obra. A experimentação poética tem origem nas vanguardas artísticas da década de 1920, que pretendiam situar o cineasta ou artista como autor portador de um modo de ver as coisas, portador de um ponto de vista. O segundo aspecto diz respeito à trajetória das técnicas de narração de histórias. A narrativa é uma característica relevante na construção do documentário, assim como a retórica. Ela proporciona “uma maneira formal (de forma) de contar histórias, que pode ser aplicada ao mundo histórico e também ao imaginário” (p. 126). O terceiro caráter do documentário é sua busca por uma voz própria através da retórica. Os documentários, através da oratória, procuram validar uma aparência do mundo histórico, pretendem convencer dos valores de uma perspectiva em relação ao objeto de análise. É a voz do cineasta que pretende assumir uma posição a respeito da sua vivência em relação ao mundo compartilhado por todos.

A voz caracteriza um modo de se perceber o real. O reconhecimento do documentário como um gênero singular e portador de uma opinião sobre o real deve-se a esses aspectos, eles colocaram o filme documentário não como um simples documento, produto de espetáculo ou uma aula de história, mas como um portador de juízos e opiniões.

* Bill Nichols – Introdução ao Documentário - CAPÍTULO 5

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